Vanessa dos Santos Bodstein Bivar

 DANÇA DO VENTRE E HISTÓRIA: OS VÁRIOS TONS DO ORIENTALISMO


Pensar em dança do ventre é também estabelecer contato com a ideia de arte, corpo e suas inter-relações. O mundo da arte é concreto, vivo e pode ser observado e compreendido. Assim, o mesmo só faz sentido com a existência de três elementos: o artista, o espectador e a obra de arte em si. O primeiro produz, cria e corporifica o produto final. E o segundo, por sua vez, se apropria e ressignifica a arte, tendo papel ativo e até mesmo transformador no processo.

É notório que essas manifestações variam de acordo com as épocas, lugares, contextos e pessoas que dela fizeram parte, sendo, portanto, dotada de historicidade – a história influencia e é influenciada pelas criações artísticas. Não obstante, não há uma perspectiva de “evolução” da arte ou da existência de obras “melhores” em detrimento de outras – cada qual tem seus valores e concepções próprias, assim como são repletas de significados e de intencionalidades passíveis das mais diversas interpretações, dependendo do indivíduo ou do grupo social que a analisa.

A dança é uma forma de arte que, com linguagem não verbal, revela uma maneira de ser e estar no mundo [SARAIVA, 2005] e é “reflexo consciente e inconsciente da sociedade e de seu imaginário [SIQUEIRA, 2006, p. 207] – o que significa que é histórica e culturalmente produzida. Nela o corpo é o instrumento de comunicação e adquire papel relevante como “suporte de identidades ao mesmo tempo em que matriz de significados” [SIQUEIRA, 2006, p. 39].

A história da dança no Brasil pauta-se por uma grande lacuna e, em geral, é reflexo dos escritos europeus e norte-americanos. Relegada a segundo plano por historiadores, se debruçam ao estudo dessa área ex-bailarinos, jornalistas e músicos que formulam obras totalizantes – em um mesmo volume abarcam da antiguidade à contemporaneidade. Assim, percebe-se que “a insistência em reproduzir os mesmos padrões da escrita fez com que a História da Dança se tornasse repetitiva (de certa forma obsoleta, por não acrescentar novas/outras trajetórias/histórias)” [SILVA, 2012, p. 29].

A dança do ventre insere-se igualmente nesse contexto como um hiato de pesquisa. Marginalizado nos meios acadêmicos, o assunto permanece relacionado à resistências, preconceitos e ideias cristalizadas, como a de que deve somente ser relegado “a boates, casas de shows e cabarés” [XAVIER, 2006, p. 02]. A escassez de bibliografia ainda propicia a existência de informações contraditórias e confusas, grosso modo, encontradas na internet, de modo a cristalizar imagens ocidentalizadas e em especial sexualizadas – “nenhuma arte é vítima maior de mal-entendidos, juízos sentimentais e interpretações místicas do que a arte da dança” [LANGER apud SARAIVA, 2005, p. 177].

Não há consenso sobre as origens da dança do ventre ou qualquer tipo de precisão cronológica. Teorias díspares e sem sustentação concreta de fontes sugerem versões sumérias, paleolíticas, egípcias ou ligações com a bíblia [XAVIER, 2006], mas sempre tendentes à ideia de ritos de fertilidade e maternidade, portanto, ligadas eminentemente à mulher [SILVEIRA, 2017].

Mesmo sem embasamento, vários são os escritos sobre as suas origens que aparecem com uma aura de verdade absoluta. E é a partir desse horizonte caótico sobre os mitos de criação que também se justifica a necessidade de pautar a dança do ventre como manifestação cultural e artística capaz de estimular reflexões e ser objeto de investigação.

Relatos de viajantes dos séculos XVIII e XIX, mesmo carregados de visões ocidentais, colocam que o baladi (denominação pela qual também é conhecida da dança do ventre) fazia parte do universo cotidiano e familiar do Egito. Tinha relevância em aniversários, casamentos, circuncisões, noivados e comemorações das cheias do Nilo [SALGEIRO, 2012]. A dança era aprendida no interior da família e a prática dava-se tanto por homens, como por mulheres sem a necessidade de professores.

O caráter de festejo, no entanto, foi aos poucos sendo suplantado por uma dança urbana e voltada ao entretenimento. No Egito, lugar de altos impostos, conflitos populares e empobrecimento, o baladi passou a ser visto como uma alternativa de sobrevivência para a população. Com incursões francesas e inglesas, por tratar-se de uma região estratégico-militar e com potencial de mercado, a dança funcionava como diversão de soldados e residentes estrangeiros, além de fonte de renda para dançarinas de rua já nos séculos XVIII e XIX.

Em busca de novos mercados para o consumo de seus produtos, fornecimento de matérias-primas e investimento de capitais excedentes, França, Inglaterra e Estados Unidos precisavam criar justificativas ideológicas de dominação a partir de representações sobre o outro.

No oitocentismo, o neocolonialismo britânico, com base etnocêntrica, propunha ideias sobre “o atraso, a indolência e a negligencia moral dos egípcios e sobre a necessidade de adotar a moral inglesa” [XAVIER, 2006, p. 47]. Sob esse estereótipo de dominação que acentua o binômio “civilização” x barbárie, os ingleses queriam moldar os costumes egípcios.

A representação é uma maneira de dividir/ classificar as apreensões de mundo a partir dos interesses dos grupos que as forjam [CHARTIER, 1990]. Assim, fazia-se necessário expandir o “processo civilizador” [ELIAS, 1994], sem o qual, nessa perspectiva, o homem teria atitudes primárias e agiria por instinto baseado em suas vontades. Consequentemente só seria aceito quem participasse das regras civilizatórias. Fora disso, haveria a marginalização. O “eu” e o “outro”, ocidente e oriente, aparecem aí sempre tencionados, na medida em que identificar-se como grupo é diferenciar-se em relação ao outro [BAUMAN, 2005].

No imperialismo arquitetou-se a ideia de que as nações adiantadas tinham uma missão civilizadora (“fardo do homem branco”) diante de homens “rústicos e atrasados” na escala de evolução humana e sócio- econômica - tudo articulado a uma capa de legitimidade científica e ideológica.

O comportamento feminino e a dança estavam nos contornos do que deveria ser moralizado de acordo com a ótica europeia. Dançar fora da família era visto como algo negativo e também atacado pelas autoridades religiosas locais, as quais voltaram-se contra a exposição da mulher egípcia à não muçulmanos [SALGEIRO, 2012].

De toda forma, mesmo diante desse contexto histórico, é notório que a dança do ventre já estava sedimentada na estrutura social e cultural egípcia. Porém, grupos de dançarinos que moravam em um mesmo bairro e casavam-se entre si, o que denota essa sedimentação, começaram a se tornar incômodos às novas elites e às lideranças religiosas, tanto que, em meio ao discurso europeu de controle sanitário e de urbanização, as danças foram contidas em espaços fechados como cabarés e cafés.

É necessário acentuar que o neocolonialismo foi mais incisivo em seu olhar negativo sobre a dança do ventre do que a religião muçulmana. Se em alguns locais ela foi banida pelo conservadorismo religioso, em outros era sinônimo de alegria nas festas familiares. “Ao contrário do que se poderia supor, a censura do islamismo à dança do ventre não é tão ostensiva quanto foi a moralidade cristã europeia que se instalou durante a colonização britânica em países árabes” [XAVIER, 2006, p. 106].

Modos de representar e de formar identidades mesclam-se nesse contexto. Para Bourdieu “o campo das representações é uma instância do jogo de poder e da manifestação de lutas sociais. A representação do outro se daria em função de uma necessidade que nós mesmos temos em nos definir. As ‘fronteiras mágicas’ que separam o eu do outro, o nós e os outros, teriam como objetivo principal impedir aqueles que se encontram no lado mais favorecido da linha imaginária a ultrapassarem e perderem seu valor” [BOURDIEU, 1998 apud XAVIER, 2006, p. 34].

Ao caracterizar o ser oriental, especialmente franceses, britânicos e norte-americanos forjaram, por contraposição, o que era ser europeu ou proveniente dos EUA. De um lado o ocidental, civilizado, branco e racional e, de outro oriental, selvagem, de cor e emotivo.

A noção de identidade não é estática ou atemporal, mas construída e negociada a partir das necessidades criadas por grupos ao longo da história e, no caso do século XIX, a questão era a da afirmativa de dominação sobre outros povos.

A identidade em si não tem existência concreta até que se lhe atribua significado. Dessa maneira construiu-se o orientalismo – conjunto de saberes literários, “eruditos” e com tom de cientificidade sobre o oriente. Delineia-se uma geografia imaginativa representada pelo ocidente que coloca as fronteiras entre o “eu” e o “outro”. Essa visão aloca o oriental como um ser exótico, misterioso, inferior, enfim, aquele que precisa ser dominado [SAID, 2007] e erige estereótipos e dicotomias com projeções sobre a realidade oriental que sedimentam uma “fantasia simplista e distorcida” [XAVIER, 2006, p. 27].

O termo dança do ventre também vem carregado de neocolonialismo e perspectivas orientalistas. Nas Exposições Universais esses traços foram ainda mais acentuados e o baladi divulgado, tornando-se mais conhecido no ocidente.

A segunda metade do século XIX apresentava uma conjuntura de ampliação e aceleração do industrialismo – era a II Revolução Industrial. Fazia-se, nesse meio, necessária a representação material do projeto capitalista assim como vislumbrada pela filosofia dominante, só que construída de modo palpável e visível [BARBUY, 1996]. Um mundo de novas experiências e sensações abria-se em especial às elites.

Nas Exposições Universais, tipificação concreta do capitalismo industrial, novidades tecnológicas de cada país eram expostas de maneira a evidenciar a eficiência das indústrias europeia e norte-americana. Ao redor da “grande” produção ocidental vinha, em menor escala, a de países orientais com estéticas “exóticas” que ratificavam a dualidade centro x periferia e consolidavam um imaginário sobre o oriente.

“Entendemos as Exposições (Universais) como modelos de mundo materialmente construídos e visualmente apreensíveis. Trata-se de um veículo para instruir (ou industriar) as massas sobre os novos padrões da sociedade industrial (um dever-se de ordem social)”. [BARBUY, 1995, p.1-2]

A dança do ventre apareceu nas feiras mundiais como circuito de entretenimento. Os lucros aumentavam à medida em que o frequentador percebesse os diferentes modos de vida relativos ao pitoresco e ao exótico. Na Exposição Universal de 1889 passeava-se em lombo de burro, observava-se o camelo e aproximadamente 2.000 pessoas assistiram a um espetáculo de dança do ventre. Era clara a ressignificação. Não mais no veio original da esfera familiar, a dança passou a ser encenada/coreografada no palco do teatro e com apelo erótico. Começava a se massificar um imaginário oriental – em que estava inclusa a dança do ventre – que representava as sociedades de acordo com os interesses ocidentais, de modo a reforçar as relações de poder [SALGUEIRO, 2012].

Em 1893 ocorreu o The Chicago World´s Columbian Exposition, com o intuito de propagar os produtos frutos da industrialização, mas também refletir e celebrar a cultura norte-americana. Solomon Bloom, presente na Exposição de 1889, negociou com um produtor francês para levar um grupo de dançarinas para essa feira como parte das estratégias para atrair patrocinadores. Esse capitalista norte-americano nomeou a dança com o termo belly dance que, traduzido para o português, significa dança do ventre. Portanto, o nome como a conhecemos, e mesmo sua forma de apresentação é produto do imaginário ocidental. Nem mesmo a música de acompanhamento (debarke) continuou a original, mas passou a ser manipulada e feita ao som do piano. Em 1900, os europeus rotulavam as músicas orientais como bizarras, selvagens e irritantes aos ouvidos [SALGUEIRO, 2012].

A belly dance entrou assim para o circuito de consumo. No oriente, visões que a colocavam como forma de ganhar dinheiro tomavam força e influenciavam pessoas a entrar nessa ótica comercial de sobrevivência. Então, “à medida que cresce o interesse dos olhares externos ou existem chances de comercialização dessas manifestações, muitos de seus conteúdos e significados são alterados” [XAVIER, 2006, p. 48].

O século XX foi repleto dessas apropriações através do cinema. Hollywood, sob influência do orientalismo, propulsionou mudanças nos costumes das dançarinas retratadas, reforçando o binômio civilização x barbárie. Nos filmes foram acentuados papéis negativos acerca dos árabes e as proposições da dança do ventre como algo vulgar, sensual. Dado ser mensagem repetida maciçamente ao longo do tempo, tende a ficar na cabeça do público como verdade.

 

“Estamos cercados por um dilúvio de imagens. Seu número é tão grande, estão presentes tão ‘naturalmente’, são tão fáceis de consumir que nos esquecemos que são produtos de múltiplas manipulações, complexas, às vezes muito elaboradas. O desafio da análise talvez seja reforçar o deslumbramento do espectador, tornando, porém, esse deslumbramento participante’ [VANOYE e GOLIOT-LETÉ, 2011, p. 13].

 

Em um filme a sociedade não é propriamente mostrada, mas é encenada. A película “faz escolhas, organiza elementos entre si, decupa no real e no imaginário, constrói um mundo possível que mantem relações com o mundo real” [PEREIRA, 2012, p. 33]. Trata-se de uma elaboração pensada com sequências de cenas e dados sensoriais que envolvem o espectador, além de massificar ligações de marketing e ganhos comerciais.

O desenho “Pato Donald e diversões de um centavo” é exemplo das representações feitas sobre a dança do ventre. Nela a pata Margarida performa a dança “dos sete véus”, o que deixa Donald alterado em seus comportamentos (a partir de uma pretensa sensualidade). Enquanto ela dança há a sombra de um demônio projetada na parede, o que sugere que a visão demoníaca da dança tenha provocado as alterações em Donald.

Em “Aladim e a Lâmpada Mágica” aparece o típico estereótipo do harém, ademais de uma escrava negra cuidando da princesa e as dançarinas do ventre ao som de um músico sentado ao chão. Trata-se de uma representação típica das pinturas orientalistas dos séculos XVIII e XIX e realocada em contextos da produção cinematográfica.

As películas, assim, articulam significados às bailarinas especialmente entre as décadas de 1930 e 1950, cristalizando a produção de uma imagem em que a mulher se destina à apreciação do olhar do outro [REIS, 2007]. A conotação sensualizada gera fortes contornos e adquire viés único ao ser generalizada no imaginário.

O ponto maior é que a dança do ventre se tornou uma arte híbrida, pois não há mais qualquer relação de autenticidade ou pureza. Diante da lógica do mercado e do consumo, constituiu-se em um bem fluido e transnacional, incorporando elementos dos diferentes espaços em que foi praticada: “essa dança, ao ser deslocada de seu contexto original, adquire novos sentidos e usos, resultando em novas linguagens” [SALGUEIRO, 2012, p. 16]

No Brasil não foi diferente. A mescla e a visão mercadológica imperaram através das músicas e das cantoras, respectivamente colombiana e norteamericana, Shakira e Britney Spears. Os movimentos pélvicos propagam um estilo de dança. Em reportagem de 2019, Shakira, filha de libanês, comenta:

 

“a dança do ventre me representa. Tenho tentado incorporá-la de maneiras diferentes à música moderna. Algumas vezes me irrita um pouco ouvir pessoas dizendo que mexo o traseiro com absurda dose de sensualidade ao invés de entender a dança como um movimento que, sim, é repleto de sensualidade, mas também é parte de uma expressão artística” [SHAKIRA apud GONÇALVES, 2020].

 

Percebe-se nesse trecho o quanto são enraizadas as visões orientalistas como parte da colonialidade - legado cultural e material do neocolonialismo que permanece até os dias de hoje – ao enxergar a dança do ventre como sexualizada.

A novela O Clone, como inserção cultural, perpetrou a imagem da dança do ventre e incitou a procura de estúdios para a sua aprendizagem. Transmitida em 2001 pela Rede Globo de Televisão, em meio a um momento de tensão internacional por conta dos atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos, deu maior visibilidade ao Islã. Enquanto o noticiário se detinha à questão do terrorismo, a novela colocava outro olhar, mais aberto e não violento.

Era patente a disseminação de um ideário que aliava o mundo muçulmano às concepções como violência, pobreza, atraso, fanatismo e terrorismo. Logo, o Islã era vinculado exclusivamente à intolerância e isso se tornou senso comum.

Não obstante, os personagens da novela não tinham esses signos negativos. Tio Ali, símbolo da religiosidade muçulmana tradicional na trama, salientou em diálogo: “o Alcorão diz que quem tira a vida de um homem, tira a vida da humanidade inteira (...) Deus amaldiçoa o assassino, o assassino está condenado a cozinhar no mármore do inferno” [QUEIROZ PORTO, 2014, p. 904].

A televisão como setor industrial de grande alcance, atingindo as massas, foi um poderoso meio de difusão e construção do imaginário sobre o Islã. Por meio das telas, e não por leitura ou ensino (aliás História do Oriente enquanto disciplina pouco se vê no âmbito universitário), foi que o grande púbico teve acesso a essa religião.

As construções de cena e o enredo tratavam-se de representações que produziam um sentido sobre o real e, ao mesmo tempo, serviam de estímulo para a discussão de temas variados relacionados ao oriente.

Uma das formas de aguçar os sentidos e envolver o espectador foi utilizar o recurso da sonoridade e de visualidade da dança. Recorrente entre outras personagens, mas principalmente na protagonista Jade, estava a performance da dança do ventre que caiu nas graças do público e fez girar o mercado de ensino de belly dance, o qual engloba hoje aulas, feiras, apresentações, venda de roupas, encontros, dentre outros dispositivos comerciais.

Assim, o baladi tornou-se híbrido, não mais pertencente a um local ou cultura específica. As suas significações variaram e se adaptaram à medida das demandas dos grupos e papeis socioeconômicos ao longo dos séculos.

 

“Toda prática cultural reflete seu ambiente social e político e é a partir desse entendimento que [...] a dança do ventre hoje se pratica não é apenas milenar e sagrada como querem crer boa parte das defensoras contemporâneas: é antes uma linguagem de sobrevivência, resultado bem-sucedido de uma adaptação longa e dolorosa” [SALGUEIRO, 2012, p. 43].

 

Percebe-se que a dança do ventre não permaneceu estanque, mas passou por mutações e sobreviveu aos contextos históricos. E é justamente por conta dessa ampla trajetória que permeia oriente e ocidente e suas inter-relações a partir da construção de um conjunto de representações, assim como por agregar a vida efetiva de variados agentes e suas composições de identidade, que o baladi é dotado de historicidade. Lacuna nos trabalhos acadêmicos, merece fazer parte do rol de temas relevantes a serem investigados.

 

Referências

Vanessa dos Santos Bodstein Bivar é doutora em História Econômica pela Universidade de São Paulo e docente do curso de licenciatura em História da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (FACH/UFMS).

 

BARBUY, Heloisa. O Brasil vai a Paris em 1889: um lugar na Exposição Universal In:  ANAIS DO MUSEU PAULISTA: HISTÓRIA E CULTURA MATERIAL 4(1), São Paulo. Anais ..., 1996. 

BAUMAN, Zygmunt. Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2005.

CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil S.A, 1990.

ELIAS, Norbert. O processo civilizador: Uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1994.

GONÇALVES, Josiane. Shakira e a dança do ventre que encanta o mundo, 2020. Disponível em https://xouu.com.br/celebs/Shakira-e-a-danca-do-ventre-que-encanta-o-mundo-20201014-0011.html. Acesso em 10/11/2020.

PEREIRA, Wagner Pinheiro. O Poder das Imagens. Cinema e Política nos Governos de Adolf Hitler e Franklin D. Roosevelt (1933-1945). São Paulo: Alameda Casa Editorial, 2012.

PORTO, César Henrique de Queiroz. Representações do Islã na novela O Clone. Diálogos, v. 18, n.2, p. 895-926, mai.-ago./2014.

REIS, Alice Casanova dos. A atividade estética da dança do ventre, 2007. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.

SAID, Edward W. Orientalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

SALGUEIRO, Roberta da Rocha. “Um longo arabesco”. Corpo, subjetividade e transnacionalismo a partir da dança do ventre, 2012. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Antropologia Social, Universidade de Brasília, Brasília.

SARAIVA, Maria do Carmo. O sentido da dança: arte, símbolo, experiencia de vivida e representação.  Movimento, v. 11, n. 3, p. 219-242, set/dez, 2005.

SILVA, Carmi Ferreira. Por uma história da dança: reflexões sobre as práticas historiográficas para a dança no Brasil contemporâneo, 2012. Dissertação (Mestrado em Dança) – Escola de Dança, Universidade Federal da Bahia.

SILVEIRA, Marília Balbi. O corpo como objeto e como lugar na dança do ventre: contribuições da somaestética. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL FAZENDO GÊNERO 11 E 13TH WOMEN´S WORLDS CONGRESS, 2017, Florianópolis. Anais..., 2017.

SIQUEIRA, Denise da Costa Oliveira; SIQUEIRA Euler David. O corpo que dança: percepção, consciência e comunicação.  Logos, n. 20, p. 62-75, 1º. sem. de 2004.

VANOYE, F.; GOLIOT-LÉTÉ, A. Ensaio sobre Análise Fílmica. 7. ed. Campinas: Papirus, 2011.

XAVIER, Cínthia Nepomuceno. ...5, 6, 7 ... Do oito ao infinito: por uma dança sem ventre, performática, híbrida, impertinente, 2006. Dissertação (Mestrado em Artes) – Instituto de Artes, Universidade de Brasília, Brasília.

17 comentários:

  1. CARA PROFESSORA VANESSA. Parabenizo pelo seu trabalho a ideia de resinificar a cultura da dança do ventre e desmistificando a primeira situação de preconceito contra o Oriente que é visível e contextuado por EDWARD SAID, o desprezo e a visão distorcida do ocidente para com o oriente. O Outro ponto e a ideia do machismo e a justificativas baseadas em conceitos fálicos e religiosos contra a mulher e seu corpo. Nesse aspecto seu trabalho apresenta essas duas realidades distintas que no meu ponto de vista tem uma importância para abranger discussões tanto no preconceito contra o oriente como também o contexto do machismo?
    OBRIGADO ELOIS ALEXANDRE DE PAULA

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    1. Agradeço muito suas gentis palavras.
      Somente não compreendi a última passagem. Trata-se de uma afirmação? Caso seja uma questão, poderia, por favor, me esclarecer melhor?
      Abraços.

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    2. Vou reformular a questão . No que se diz respeito à dança do ventre ela sempre foi vista pelo ocidente pelo viés machista e pelo racismo condicionado pelo ocidente contra o Oriente?

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    3. Claro. Obrigada por esclarecer.
      Na realidade, não há consenso sobre as origens da dança do ventre. Porém, sabe-se que ela fazia parte do universo cotidiano e familiar do Egito. Tinha relevância em aniversários, casamentos, circuncisões, noivados e comemorações das cheias do Nilo [SALGEIRO, 2012]. A dança era aprendida no interior da família e a prática dava-se tanto por homens, como por mulheres sem a necessidade de professores.
      Posteriormente, em um contexto de aumento dos tentáculos imperialistas no século XIX, de modo especial da França e Inglaterra, a dança se tornou componente de entretenimento urbano. Funcionava como diversão de soldados e residentes estrangeiros, ademais de alternativa de sobrevivência para uma população empobrecida, saindo de seu caráter familiar.
      Foi aí que, com um olhar orientalista e de uma suposta "missão civilizatória", propunha-se ideias sobre “o atraso, a indolência e a negligencia moral (...) e sobre a necessidade de adotar a moral inglesa” [XAVIER, 2006, p. 47]. O comportamento feminino e a dança estavam nos contornos do que deveria ser moralizado de acordo com a ótica europeia.
      Por sua vez, na própria Exposição Universal de 1889 e na The Chicago World´s Columbian Exposition em 1893, a dança foi encenada/coreografada com claro apelo erótico feminino e tons de exotismo.
      O nome dança do ventre veio da designação dada por franceses como danse du ventre e, depois, belly dance pelos ingleses. Portanto, o nome como a conhecemos, e mesmo sua forma de apresentação é produto do imaginário ocidental.
      Infelizmente, até os dias atuais e como a mentalidade é da longa duração, a dança do ventre é vista sob olhares preconceituosos e misóginos, dentre os quais, o de “você vai dançar para o seu marido?”.
      Abraços.

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  2. Cumprimento, a autora Vanessa dos Santos Bodstein Bivar, pelo trabalho intitulado “dança do ventre e História: os vários tons do orientalismo”, que fala que pensar em dança do ventre é também estabelecer contato com a ideia de arte, corpo e suas inter-relações. O mundo da arte é concreto, vivo e pode ser observado e compreendido. Assim, o mesmo só faz sentido com a existência de três elementos: o artista, o espectador e a obra de arte em si. O primeiro produz, cria e corporifica o produto final. E o segundo, por sua vez, se apropria e ressignifica a arte, tendo papel ativo e até mesmo transformador no processo. Assina Francielcio Silva da Costa.

    Quais são as características do orientalismo que estão presentes na dança do ventre ?

    Como a novela o Clone, retratou a dança do ventre ?

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    1. Olá,
      obrigada pela sua gentil leitura.
      Sobre a primeira questão:
      O nome dança do ventre veio da designação dada por franceses como danse du ventre e, depois, belly dance pelos ingleses. Portanto, o nome como a conhecemos, e mesmo sua forma de apresentação é produto do imaginário ocidental.
      Em um contexto de aumento dos tentáculos imperialistas, de modo especial da França e Inglaterra, a dança se tornou componente de entretenimento urbano. Funcionava como diversão de soldados e residentes estrangeiros, em particular no Egito, ademais de alternativa de sobrevivência para uma população empobrecida, saindo de seu caráter familiar.
      Assim, com um olhar orientalista e de uma suposta "missão civilizatória", propunha-se ideias sobre “o atraso, a indolência e a negligencia moral dos egípcios e sobre a necessidade de adotar a moral inglesa” [XAVIER, 2006, p. 47]. O comportamento feminino e a dança estavam nos contornos do que deveria ser moralizado de acordo com a ótica europeia.
      Por sua vez, na própria Exposição Universal de 1889 e na The Chicago World´s Columbian Exposition em 1893, a dança foi encenada/coreografada com claro apelo erótico feminino e tons de exotismo.
      Infelizmente, até os dias atuais e como a mentalidade é da longa duração, a dança do ventre é vista sob olhares preconceituosos, dentre os quais, o de “você vai dançar para o seu marido?”.
      Em relação à segunda questão, por ser demasiado ampla, sugiro a leitura de QUEIROZ PORTO, César Henrique de. Representações do Islã na telenovela O Clone. Diálogos, Maringá, v. 18, n. 2, p. 895-926, mai./ago. 2014.
      Abraços.

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  3. Olá,
    obrigada pela sua gentil leitura.
    Sobre a primeira questão:
    O nome dança do ventre veio da designação dada por franceses como danse du ventre e, depois, belly dance pelos ingleses. Portanto, o nome como a conhecemos, e mesmo sua forma de apresentação é produto do imaginário ocidental.
    Em um contexto de aumento dos tentáculos imperialistas, de modo especial da França e Inglaterra, a dança se tornou componente de entretenimento urbano. Funcionava como diversão de soldados e residentes estrangeiros, em particular no Egito, ademais de alternativa de sobrevivência para uma população empobrecida, saindo de seu caráter familiar.
    Assim, com um olhar orientalista e de uma suposta "missão civilizatória", propunha-se ideias sobre “o atraso, a indolência e a negligencia moral dos egípcios e sobre a necessidade de adotar a moral inglesa” [XAVIER, 2006, p. 47]. O comportamento feminino e a dança estavam nos contornos do que deveria ser moralizado de acordo com a ótica europeia.
    Por sua vez, na própria Exposição Universal de 1889 e na The Chicago World´s Columbian Exposition em 1893, a dança foi encenada/coreografada com claro apelo erótico feminino e tons de exotismo.
    Infelizmente, até os dias atuais e como a mentalidade é da longa duração, a dança do ventre é vista sob olhares preconceituosos, dentre os quais, o de “você vai dançar para o seu marido?”.
    Em relação à segunda questão, por ser demasiado ampla, sugiro a leitura de QUEIROZ PORTO, César Henrique de. Representações do Islã na telenovela O Clone. Diálogos, Maringá, v. 18, n. 2, p. 895-926, mai./ago. 2014.
    Abraços.

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  4. Olá, muito interessante ler sobre a desmistificação da dança do ventre, o Ocidente como sempre impondo seus conceitos e derivações culturais.
    De que maneira se vê a dança como meio de sobrevivência e a sexualização da mesma?
    Att.: Lidiane Álvares Mendes

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    1. Olá. Muito obrigada pela sua leitura!
      Quanto à questão, primeiro pensemos no século XIX, momento em que foi formulada a denominação de danse du ventre ao que já era uma mescla de práticas de danças do norte da África e do Oriente Médio com elementos de danças ocidentais.
      Em especial no Egito - lugar de altos impostos, conflitos populares e empobrecimento -dominado pelos tentáculos imperialistas ingleses e com visões orientalistas, o baladi era uma alternativa de sobrevivência para a população.
      A dança funcionava como diversão de soldados e residentes estrangeiros, além de fonte de renda para dançarinas de rua e, nas Exposições Universais, era parte das estratégias para atrair patrocinadores. Tudo encarado como exótico e de apelo sexual feminino em um conjunto de ideias que corroborava a dominação europeia no quesito civilização x barbárie.
      A escassez de bibliografia ainda propicia a existência de informações contraditórias e confusas, grosso modo, encontradas na internet, de modo a cristalizar imagens ocidentalizadas e em especial sexualizadas.
      A própria cantora Shakira afirma: ““a dança do ventre me representa. Tenho tentado incorporá-la de maneiras diferentes à música moderna. Algumas vezes me irrita um pouco ouvir pessoas dizendo que mexo o traseiro com absurda dose de sensualidade ao invés de entender a dança como um movimento que, sim, é repleto de sensualidade, mas também é parte de uma expressão artística” [SHAKIRA apud GONÇALVES, 2020].
      Enfim, até os dias atuais e como a mentalidade é da longa duração, a dança do ventre é vista sob olhares preconceituosos e misóginos, dentre os quais, o de “você vai dançar para o seu marido?”.

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  5. Lara Raquel de Souza e Maia7 de outubro de 2021 às 16:11

    Professora Vanessa, parabenizo o excelente texto. Tenho grande interesse pelas pesquisas relacionadas à História e Cultura, achei muito interessante a forma como você analisou a questão da dança do ventre numa perspectiva de que a mesma era uma prática de sobrevivência. Sendo assim, minha pergunta é: existiram outras expressões culturais do Oriente que foram utilizadas no viés da sobrevivência da população oriental?

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    1. Olá. Muito obrigada pela sua gentil leitura.
      Provavelmente sim. Infelizmente, não tenho um embasamento bibliográfico mais consistente para responder de modo adequado a essa questão.
      Abraços.

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  6. Professora Vanessa, parabéns pelo seu excelente trabalho! Em uma temática tão importante, mas tão pouco trabalhada. Então Professora quais são esses fatores que contribuíram para transformaram a história da dança em absoletas, quais as razões dessa história ter sido construída e pensada de forma repetitiva? Você acredita que a novela o clone colaborou? Para se quebrar um pouco os estereótipos da dança do ventre e a sua sexualização?

    Att.
    Amanda Karem Falcão Da Silva

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    1. Olá.
      Muito obrigada por sua apreciação.
      Em realidade, a dança é tema pouco estudado pelos historiadores no Brasil (não se tem precisão a respeito das causas disso) – o que corrobora em grandes lacunas e a repetição dos ideários colocados em obras mais antigas e/ou produzidas em outros países.
      Já a novela O Clone, como inserção cultural, perpetrou a imagem da dança do ventre e incitou a procura de estúdios para a sua aprendizagem. Transmitida em 2001 pela Rede Globo de Televisão, em meio a um momento de tensão internacional por conta dos atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos, deu maior visibilidade ao Islã. Enquanto o noticiário se detinha à questão do terrorismo, a novela colocava outro olhar, mais aberto e não violento. Era patente a disseminação de um ideário que aliava o mundo muçulmano às concepções como violência, pobreza, atraso, fanatismo e terrorismo. Logo, a religião muçulmana era vinculada exclusivamente à intolerância e isso se tornou senso comum.
      Não obstante, os personagens da novela não tinham esses signos negativos, pelo contrário. Tio Ali, símbolo da religiosidade muçulmana tradicional na trama, salientou em diálogo: “o Alcorão diz que quem tira a vida de um homem, tira a vida da humanidade inteira (...) Deus amaldiçoa o assassino, o assassino está condenado a cozinhar no mármore do inferno” (QUEIROZ PORTO, 2014, p. 904).
      A televisão como setor industrial de grande alcance, atingindo as massas, foi um poderoso meio de difusão e construção do imaginário sobre o Islã. Por meio das telas, e não por leitura ou ensino (aliás História do Oriente enquanto disciplina pouco se vê no âmbito universitário), foi que o grande púbico teve acesso ao Islã. As construções de cena e o enredo tratavam-se de representações que produziam um sentido sobre o real e, ao mesmo tempo, serviam de estímulo para a discussão de temas variados relacionados ao oriente.
      Uma das formas de aguçar os sentidos e envolver o espectador foi utilizar o recurso da sonoridade e de visualidade da dança. Recorrente entre outras personagens, mas principalmente na protagonista Jade, estava a performance da dança do ventre que caiu nas graças do público e fez girar o mercado de ensino de belly dance, o qual engloba hoje aulas, feiras, apresentações, venda de roupas, encontros, dentre outros dispositivos comerciais.
      Abraços.

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  7. Professora Vanessa, parabenizo o excelente texto. Tenho grande interesse pelas pesquisas relacionadas à História e Cultura, achei muito interessante a forma como você analisou a questão da dança do ventre numa perspectiva de que a mesma era uma prática de sobrevivência. Sendo assim, minha pergunta é: existiram outras expressões culturais do Oriente que foram utilizadas no viés da sobrevivência da população oriental?

    Att: Lara Raquel de Souza e Maia

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    1. Olá, essa questão já foi respondida acima.
      Abraços.

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