Maria Eugênia Silva e Silva e Alina Silva Sousa de Miranda

 O CONHECIDO DESCONHECIDO: CONSIDERAÇÕES SOBRE O TEMA ORIENTE NA DISCIPLINA HISTÓRIA


De onde provém os termos “Oriente” e “Ocidente”? O que sabemos sobre o Oriente? Qual a sua importância para a história ocidental? Como as aulas de História podem influenciar no fortalecimento de uma visão estereotipada e negacionista dos povos denominados “orientais”? Essa e outras questões são importantes de serem refletidas no ambiente educacional, de modo que só assim pode-se saber qual a natureza dos conhecimentos que estão sendo ensinados àqueles que serão os futuros profissionais da educação ou não de nossa sociedade.

É certo que o conhecimento que a maioria das pessoas possui sobre a história das civilizações, dos vários povos que já habitam todo o globo terrestre, das revoluções e das guerras que aconteceram em diferentes períodos da história etc., é construído apenas no ambiente escolar, desde o ensino fundamental até o ensino médio. Assim, a forma como um professor ministra suas aulas e ensina os conteúdos presentes no livro didático da disciplina de História, que é nosso foco de observação, acaba por influenciar significativamente na maneira como os alunos constroem o seu conhecimento sobre o passado e na maneira como ambos irão entender ou interpretar a sociedade e o mundo ao seu redor.       

Diante disso, algo que é notável e que não se pode deixado de lado é o fato de, nas aulas de História na educação básica, ser pouco trabalhado o conteúdo relacionado aos povos orientais. Menos ainda [ou talvez de maneira nenhuma] é abordado o quanto estes foram fundamentais para a história ocidental, a qual, durante muito tempo, tem sido colocada em várias pesquisas como ponto referência na produção de diferentes tipos de conhecimentos. Por que um povo evita de ressaltar as influências que recebeu? Por que não reconhecer e deixar claro as trocas no nível material e espiritual, de conhecimento? Qual o limite entre a realidade vivida e a realidade contada?

Com base nessas questões e reconhecendo a importância e a influência que os conhecimentos historiográficos ensinados no ambiente escolar podem ter na vida de uma pessoa, o presente texto tem por objetivo discutir a ausência do ensino de conteúdos referentes à história das civilizações orientais e suas contribuições para a formação da chamada cultura ocidental nas aulas da disciplina de história no ensino fundamental e médio a partir de revisão bibliográfica.

Como referência teórica foram utilizadas Febvre [2004], Goody [2008], Said [1990], principalmente, e outros que discutem a abordagem de temas relacionados à história oriental em sala de aula. No primeiro momento do texto, uma reflexão sobre as origens dos termos “Oriente” e “Ocidente” foi feita e a influência das narrativas históricas europeias sobre isso. Em seguida, discorremos sobre a ausência do ensino da história dos povos orientais nas aulas da disciplina de história na educação básica e como isso pode fortalecer a visão estereotipada que se tem em relação aos mesmos. Por fim, discutimos sobre a importância das constituições orientais para formação da cultura ocidental e a ausência dessa perspectiva nas narrativas historiográficas.

 

Europeização da história e da História

“Oriente” e “Ocidente” são termos que vemos comumente em vários textos, livros, lugares etc., o que consequentemente resulta na acomodação da maioria das pessoas, não havendo o interesse destas em entender a origem dos mesmos e com qual propósito se deu as suas formulações, pois o que realmente importa no momento que são utilizados é a significância que lhes são atribuídas e a intenção com qual são empregados. É mais do que necessário entender que “Oriente” e “Ocidente”, na maioria das vezes, são utilizados em dois sentidos: de um lado, para designar a divisão geográfica estabelecida pelo Meridiano de Greenwich [onde 90% da Europa está a Leste, o que corresponde geograficamente a parte Oriente]; e de outro, para se referir às diferenças dos aspectos socioculturais entre europeus e asiáticos. A radicalização dessas diferenças sob o solo da superioridade cultural é o que nos interessa ressaltar.

A disciplina História tem um enorme papel na radicalização da separação entre esses termos. Afinal, quem conta a história tende a contar a partir dos seus valores e pontos de vistas.  O contexto e as intenções pelas quais isso teria se dado é que não podem ser entendidas como algo inofensivo ou sem intenções de [des]caracterizar “o outro”, o que de acordo com Said [1990] seria desonesto, pois sempre há interesses e ambições envolvidos:

 

“Achar que o Oriente foi criado – ou, como eu digo, “orientalizado” – e acreditar que tais coisas acontecem simplesmente como uma necessidade da imaginação é agir de má-fé. A relação entre o Ocidente e o Oriente é uma relação de poder, de dominação de graus variados de uma complexa hegemonia [...].” [SAID, 1990, p. 17] 

 

A história do mundo desde o século XIX [momento em que houve a intensa busca pela escrita de uma história universal, mas que na verdade era uma história da Europa], tem sido narrada apenas a partir de uma perspectiva europeia, deixando perceptível o seu olhar etnocêntrico em relação à história dos demais povos e, quando isso não acontece, estes são sufocados e jogados na gaiola do esquecimento. Vale destacar, porém, que o etnocentrismo não pode ser entendido como algo que tem suas origens ou que seja exclusivo dos europeus, pois segundo Goody essa atitude de um povo tomar como referência os seus próprios conhecimentos e a sua cultura no momento de entender a alteridade é algo que “[...] caracterizou gregos e romanos, assim como de resto todas as comunidades. Todas as sociedades humanas exibem um certo etnocentrismo que, em parte, é um requisito de identidade pessoal e social de seus membros” [GOODY, 2008, p. 11]. Não cabe, pois, demonizar os europeus, mas compreender essas relações de poder e ajudar a desfazê-las.

Assim, pode-se dizer que a visibilidade em relação ao etnocentrismo europeu em comparação aos das demais sociedades é resultado da intensidade e da forma como as suas compreensões do outro são compartilhadas, onde a escrita ocupa o lugar de destaque nesse processo. A escrita embora pareça algo simples, ela pode destruir ou mesmo construir o que se sabe em relação a algo ou à história de um povo. Isso fica evidente quando se reflete sobre as narrativas eurocêntricas que influenciaram a visão orientalista que se tem sobre aos povos da Ásia, os quais são entendidos pela maioria das pessoas [que constroem os seus conhecimentos somente através das narrativas que partem de referências europeias ou melhor ocidentais] como exóticos, estranhos e que os aspectos de suas culturas não têm nenhuma ligação com a dos ocidentais, algo que não é verdadeiro.

Portanto, podemos dizer o Oriente foi orientalizado ao longo da história a partir das representações que lhes foram atribuídas, em especial, pelas narrativas históricas europeias produzidas desde o período da expansão imperialista e da colonização, fornecendo, assim, os artifícios de superioridade dos ocidentais em relação aos orientais [e a outros como os do continente africano], onde os povos ocidentais são apresentados com civilizados e os orientais como os bárbaros.

 

“Oriente” nas aulas de História da educação básica

O ensino dos conteúdos da disciplina de história é muitas vezes entendido como insignificante e desnecessário [assim como de outras áreas], resultado do desconhecimento das pessoas em relação ao tipo de arma poderosa que essa disciplina possui. Como mencionado anteriormente, a visão europeia em relação aos acontecimentos e aos diferentes povos influenciou significativamente o modo como as narrativas históricas são escritas, as quais ao longo de vários séculos foram utilizadas como um instrumento de dominação, pois estas ajudavam no processo de conquista não só de territórios e das riquezas de outros povos, como também de suas almas.

Sendo assim, não importava conhecer o outro, mas dominá-los. A escrita da História é uma fonte, ela mesma, de dominação.

Diante disso, entende-se um dos motivos pelos quais, no Brasil, demorou tanto tempo para que o ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena se tornasse obrigatório em todos os níveis de ensino [o que só foi possível a partir da lei 11.645/08] é esse: uma vez que a herança eurocêntrica ainda se faz muito presente em tudo que apreendemos, em especial, no ambiente escolar, a invisibilidade das demais culturas ou o demérito delas sobrevive. Consequentemente, isso também explica a ausência do ensino da história oriental na educação básica e, sobretudo, dos conteúdos que falam do quanto estes foram fundamentais para a história ocidental. Tudo isso fortalece, mesmo que indiretamente, o conhecimento estereotipado e negacionista que persiste e é divulgado.

É certo que houve o aumento dos estudos e pesquisas orientalistas nas universidades, porém, isso é ainda muito vago no ambiente escolar, visto que, muitos professores da disciplina de História estão mais preocupados em oferecer aos seus alunos o estudo dos conteúdos programáticos presentes nos currículos escolares. Para que seria útil conhecer a Ásia além da curiosidade cultural? Além disso, apenas o livro didático auxilia esse processo e eles mesmos são muito limitados.

Essa ausência, porém, deve ser desfeita porque “[...] o[a] professor[a] será a referência para o(a) estudante e muito do que ele[a] irá conhecer ou ter acesso está pautado pelas escolhas feitas pelo(a) profissional diante dele[a]” [FILATOW, 2019, p.66]. Nesse sentido, se o professor se ativer a trabalhar somente os conteúdos presentes no livro didático, muitas questões serão deixadas de lado, principalmente acerca dos povos orientais, já que há muito eles têm ocupado pouquíssimo espaço nesses livros. Priorizando os conteúdos da história europeia, é comum que nesses livros as contribuições e conhecimentos das civilizações asiáticas sejam “ignorados, aparecendo apenas em situações em que a história de alguma região da Ásia tinha relação com algum país europeu, por exemplo, durante o imperialismo sobre vastas regiões desse continente, conteúdos que só são abordados no livro do 3º ano do Ensino Médio”. [SILVA, 2019a, p. 219]

Com resultado dessa forma de ensino, se por um acaso fosse perguntado a um aluno ou a uma pessoa de fora do cenário educacional o que eles sabem sobre o Oriente ou fosse perguntado o nome dos países considerados orientais, sem buscar informações no Google, certamente as respostas seriam vagas e bem próximas das que Silva [2019] obteve em sua pesquisa:

 

“onde se localiza a China, Japão e Índia”; “é uma região com desenvolvimento elevado”; “tem a religião do Buda, as castas”. Acerca dos países, foram citados principalmente a China, o Japão, a Índia e a Coréia do Sul. A referência dada a este último é que “eles comem peixes crus e insetos”. O Japão foi citado como “um país bastante diversificado e desenvolvido, com grande população”, e como o “país que fez parte da segunda guerra mundial. As pessoas que habitam lá são parecidas”; a China foi caracterizada como “o país do kung fu”, além de ser onde se localiza “a Muralha da China e a disputa econômica contra os Estados Unidos”. [...]A primeira imagem trazia o mapa da Índia, que pareceu ser algo bem familiar a todos os alunos. Apenas um não soube responder que país representava o mapa. Quando solicitados para citarem algo sobre este país, todos deixaram a reposta “em branco”. Na sequência, foram dispostas três imagens [Muralha da China, Taj Mahal e o Taiji [Yin Yang] e pedido que escrevessem a que países eram comumente associadas e sobre a sua história. Todos souberam identificar a Muralha da China e o Taj Mahal, mas não escreveram nada sobre a história desses lugares, embora tenham identificado em que países se localizam.” [SILVA, 2019b, p. 115-116]

 

Essas respostas são o reflexo do quanto é escasso o conteúdo que discute sobre a cultura, os conhecimentos, a política e entre outros aspectos desses “orientes”. Mesmo quando uniformizado, esse tema é o “conhecido desconhecido”.

 

Orientais versus ocidentais 

A história dos conhecimentos das diversas esferas [seja elas econômica, social, cultural e entre outras] que estão presentes em documentos, livros, artigos, site etc., em sua grande maioria, partem do pressuposto de que tudo que os ocidentais possuem [de um modo geral] provém de seus próprios méritos e artifícios intelectuais, deixado de lado todos os esforços e contribuições de civilizações passadas e de outros povos que são seus contemporâneos. Febvre, ao tratar da gênese da civilização europeia, aborda esse assunto esquecido sobre a relação entre europeus [ocidentais] e asiáticos [orientais] durante esse processo: “[...] a Europa se fez contra a Ásia. Ela se afirmou resistindo à Ásia. Eu digo: foi a própria Ásia que armou a Europa contra si. E acrescento: a Europa se fez com a Ásia, graças à Ásia, pela Ásia.” [FEBVRE, 2004, p. 121]

Mas porque a “Ásia que armou a Europa contra si”? Ou mesmo porque “a Europa se fez com a Ásia, graças à Ásia, pela Ásia”? Se pegarmos um mapa que represente a divisão do grande Império Romano, em Império Romano do Ocidente e Império Romano do Oriente, veremos que o território europeu está localizado na parte que corresponde ao Império Romano do Ocidente, o qual, segundo a historiografia, foi o primeiro a desmoronar. Consequentemente, vários fatores contribuíram para que desmoronamento acontecesse, dentre eles [embora não seja muito mencionado nos livros de histórias] foi o fato do desconhecimento desse território, visto que, esse era formado por terras novas que foram anexadas ao Império Romano, enquanto o que estava sob o domínio do Império Romano do Oriente já havia passado pelo processo de conhecimento e exploração de suas riquezas e espaços. Ou seja, o Império do Ocidente pode ser caracterizado como rural em quanto que o do Oriente como citadino.

Diante disso, pode-se concluir para onde os comerciantes ocidentais avançavam na busca por produtos finos e sofisticados para vender em seus mercados, uma vez que o Ocidente tinha:

 

“[...] apenas produtos naturais maciços, matérias primas brutas a exportar nos séculos 9º, 10º e 11. Desses produtos o Oriente não tem nem necessidade nem vontade. O Ocidente, durante muito tempo, não tem produtos finos, produtos industriais, produtos manufaturados a oferecer ao Oriente, ao contrário. [...] Nessa época o Oriente continua a produzir produtos de luxo, extremamente procurados pelos ocidentais [...].” [FEBVRE, 2004, p. 154]

 

Assim, nota-se que os orientais estavam culturalmente à frente dos ocidentais. Vale destacar que os ocidentais não se beneficiaram somente dos produtos de origem oriental e ganharam forças para conquista diversas coisas em outros territórios mais distantes, como também de suas invenções, técnicas, conhecimentos e formas de governo. Apesar de não reconhecerem esse fato, o qual Goody chamou de “roubo da história, ele é uma realidade:

 

“[...] o passado é conceituado e apresentado de acordo com o que aconteceu na escala provincial da Europa, frequentemente da Europa ocidental, e então imposto ao resto do mundo. Esse continente pretendeu ter inventado uma série de instituições-chave como “democracia”, “capitalismo” mercantil, liberdade e individualismo. Entretanto, essas instituições são encontradas em muitas outras sociedades.” [GOODY, 2008, p. 8]

 

Porém, embora o autor critique aquilo que considera um viés ocidentalizado e etnocêntrico, difundido pela historiografia ocidental e o consequente “roubo” perpetrado pelo Ocidente das conquistas das outras culturas, o mesmo não desconsidera por completo o fato dos ocidentais terem também tido suas próprias conquistas ao longo dos tempos. Infelizmente o que predomina e se faz presente no meio acadêmico e no cenário social, porém, é a versão da história em que os ocidentais são superestimados enquanto os orientais são deixados de lado, sendo usados apenas como figurantes da história.

 

Considerações finais

Mediante o que foi exposto no presente artigo, nota-se também que é importante e necessário refletirmos não somente no que diz respeito à ausência dos conteúdos que abordam assuntos acerca da história oriental e das suas contribuições para a formação da cultura ocidental nas aulas da disciplina de História no ensino fundamental e médio, mas também sobre a formação e qualificação dos professores que ministram as aulas dessa disciplina. Os conhecimentos dos novos temas, que estão sendo discutidos e analisados no campo das pesquisas historiográficas, devem chegar ao ambiente escolar, ainda há desconhecimento por parte desses professores e, definitivamente, o livro didático de História não pode ser a única fonte de conhecimento. Há muito trabalho de pesquisa sobre os orientes a ser feito, como há que se inteirar dos que já estão disponíveis e acessíveis. Finalmente, há que se questionar as narrativas historiográficas que, por ser a única perspectiva disponível e por repetição, se estabelecem como verdade absoluta.  

 

Referências

Maria Eugênia é graduanda do segundo período do curso de Licenciatura em Ciências Humanas [Sociologia] pela Universidade Federal do Maranhão – UFMA. É membro do grupo de pesquisa Advaita e História.

Alina Silva Sousa de Miranda é doutora em História Social pela USP e professora de História da Universidade Federal do Maranhão – UFMA, coordena o grupo de pesquisa Advaita e História. É autora do livro Fiar poético [em dois volumes, I – Cenário do estudo tradicional e II – Meditações sobre o estudo tradicional], lançados em 2021, resultado do projeto de pesquisa de editoração e produção de documentação da tradição oral védica em língua portuguesa, projeto esse apoiado pelo Consulado da Índia do Rio de Janeiro.

 

FEBVRE, Lucien. A Europa: Gênese de uma Civilização. Trad. Ilka Stern Cohen. Bauru, SP: EDUSC, 2004. Aulas I – XIII.                   

FILATOW, Fabian. O Oriente na Sala de aula através das histórias em quadrinhos: possibilidades e diálogos possíveis. In: BUENO, André; ESTACHESKI, Dulceli; CREMA, Everton; NETO, José Maria de Sousa [Orgs.] Orientalismo Conectado. Rio de Janeiro: Edições Especiais Sobre Ontens, 2019. Disponivel em:

GOODY, Jack. O Roubo da História: Como os europeus se apropriaram das ideias e invenções do Oriente. São Paulo: Editora Contexto, 2008.

SAID, Edward W. Orientalismo: o Oriente como Invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. 

SILVA, Márcio Douglas de Carvalho e. A “descoberta” da História da Ásia pelos autores de livros didáticos: a abordagem das civilizações orientais no ensino médio. In: SILVA, Cleide M. de Carvalho; SILVA, Márcio Douglas de C. e Ronyere Ferreira (Orgs.). História, memória e práticas de ensino. Teresina: EDUFPI, 2019a. 

SILVA, Márcio Douglas de Carvalho e. A História do Oriente na educação básica: aprendizagem sobre civilizações orientais no ensino médio. In: BUENO, André; ESTACHESKI, Dulceli; CREMA, Everton; NETO, José Maria de Sousa [Orgs.] Orientalismo Conectado. Rio de Janeiro: Edições Especiais Sobre Ontens, 2019b.

56 comentários:

  1. Prezadas Sras. Maria Eugênia Silva e Silva e Alina Silva Sousa de Miranda, desde já meus cumprimentos pela Comunicação. Eu gostaria de compartilhar algumas reflexões suscitadas pela mesma:

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  2. Até que ponto a qualificação linguística, uma das habilidades que mais desenvolvem a percepção sutil do outro de quem se fala, deveria ser exigida dos professores para os ensinos fundamental e médio de história da Ásia?

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    1. Uma excelente pergunta Matheus, entendo que essa é uma das questões que merece bastante atenção, pois ao se trabalhar a história da Ásia nos ensinos fundamental e médio (níveis de ensino em que há presença de indivíduos em plena construção de sua compreensão de tudo ao seu redor e do mundo), a utilização de expressões linguísticas de maneira errada por um professor no momento das explicações do referido assunto podem contribuir no fortalecimento da visão estereotipada que se tem dos povos asiáticos. Assim, o melhor a se fazer, sem dúvida, é buscar todo o conhecimento necessário, seja por meio da leitura de matérias ou de eventos acadêmicos, que abordem sobre essa temática para evitar a construção de conhecimentos preconceituosos.

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    2. Prezada Maria Eugênia Silva e Silva, sim, sim, concordo plenamente! De fato, confesso aqui que "buscar todo o conhecimento necessário [...] por meio da leitura de [...] eventos acadêmicos" não havia passado por minha cabeça ao fazer esta pergunta. Por mais óbvia que seja esta sugestão, com efeito eu nunca havia associado estas duas dimensões, talvez porque eu esteja acostumado com o próprio ritmo de dissociação entre estas duas esferas de Ensino-Pesquisa que, infelizmente, observamos em nosso meio acadêmico, não é mesmo? Sim, sim, faz-se necessário colocá-las em diálogo, comunicação recíproca... sim,sim, exatamente...

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    3. Verdade, esses espaços têm seu papel, mas são complementares.

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  3. Mediante o tempo escasso oferecido principalmente pelo Ensino Médio, qual aspecto histórico deveria ser enfatizado/privilegiado no ensino de história da Ásia, na opinião de Vas. Sras.: o político, o econômico, o social ou o cultural?

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    1. Embora seja de suma importância o estudo de todas essas estruturas para se conhecer e entender a história da Ásia, creio que estudo do social seria um ponto que, de uma certa forma, possibilitaria a compreensão de um modo simplificado os outros três, pois como se sabe a organização social de um país ou de um povo é o reflexo das forças políticas, econômicas e culturais dos mesmos

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    2. Uma coisa que me preocupa, Matheus, é essa demanda (a escolha de uma plataforma de observação única), sobretudo porque no Oriente essas divisões não atendem completamente ao seu modo de vida e pensamento. E, se estamos interessamos em compreendê-los por eles mesmos, retirando os estereótipos, não deveríamos repensar essas divisões e cisões tão nossas? Creio que seja uma boa reflexão.

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    3. Prezada Sra. Alina Silva Sousa de Miranda, sim, sim, de fato concordo contigo neste ponto... aí, acredito, seria uma questão de refletirmos de que maneira, dentro do espaço e do tempo escassos que os Ensinos Fundamental e Médio nos possibilitam, um professor de História abordaria realidades asiáticas exatamente por estas divisões não atenderem suficientemente aos modos orientais de vida e pensamento... fica essa reflexão metodológica do Ensino de História Oriental para nós, não é verdade?

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  4. “Não cabe, pois, demonizar os europeus, mas compreender essas relações de poder e ajudar a desfazê-las.”: neste intuito, uma abordagem acerca de diversas visões asiáticas sobre europeus não seria uma contribuição crítica importante para a compreensão historiográfica mais minuciosa inclusive de realidades autóctones asiáticas?

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    1. Realmente, essa seria uma contribuição significativa para a compreensão historiográfica de um outro ângulo, porém, se realizarmos uma busca veremos que não há muitos trabalhos que abordem a visão asiática em relação aos europeus, logo, essa é um dos aspectos que dificultam na construção de argumentos que possam colocar no mesmo nível os discursos historiográficos europeus e asiáticos.

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    2. De fato, Sra. Maria Eugênia Silva e Silva, também sinto esta ausência... às vezes é mais fácil encontrar visões asiáticas sobre os próprios asiáticos (p. ex. de budistas sobre hindus, de hindus sobre chineses) do que visões asiáticas sobre europeus... ainda acredito que seria, historiograficamente, um passo considerável nos estudos históricos sobre realidades asiáticas... fica o desafio, não é mesmo...????

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    3. Sim. Penso que o desafio também é tornar acessível esse material todo, por meio da tradução e tomando todos os cuidados com essa.

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    4. Ah, sim, claro, seria por aí mesmo... muitas etapas, cada uma com seus desafios... um longo caminho que ainda temos que percorrer, sem dúvida... ;)

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  5. Não caberia a um planejamento amplo que vise a inclusão da história do continente asiático nos Ensinos Fundamental e Médio, antes disto, qualificar, em nível superior, professores que soubessem abordar estas realidades asiáticas de maneira qualificada, i.e. que evitasse reproduzir os mesmos tipos de equívocos orientalistas distorcentes de culturas asiáticas?

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    1. Sim, entendo que a qualificação dos professores para trabalharem a história da Ásia seria um dos primeiros passos para a busca pela inclusão do estudo dessa temática no currículo escolar, pois assim haveriam profissionais, que ao buscarem essa inclusão, teriam os conhecimentos necessários para desenvolver seus argumentos em defesa do ensino dessa história, do mesmo modo como aconteceu com a implementação do obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena nas escolas públicas e privadas a partir da sanção da Lei Nº 11.645, de 10 de março de 2008.

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    2. Caberia sim planejamento, e acho que atividades como esse simpósio, como ressaltou a Maria Eugênia, ajudam e muito a construir um espaço de debate, bem como ele sensibiliza para o tema, dando visibilidade para sua importância. Também acho que a qualificação em nível superior é bem-vinda, mas, novamente, atividades que completam o ensino de graduação (eventos, pesquisa, extensão etc) podem ajudar nessa construção.

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    3. Pois é, Sra. Alina Silva Sousa de Miranda, as graduações... tenho sentido um certo "abandono" da parte de professores com o Ensino e a Pesquisa exatamente nas Graduações... momento importante na propedêutica técnica, realmente acadêmica, num contexto em que exatamente este planejamento e esta sensibilização mencionados por Va. Sra. deveriam protagonizar o convívio técnico, amadurecido do ambiente universitário... exatamente... porém, vejo que estes aspectos estão, cada vez mais, relegados à coadjuvância em nome de uma produtividade de pós-graduação sempre compulsiva e, majoritariamente, redundante... triste, né...

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  6. Não existe o risco de uma crítica à construção do Oriente pelo Ocidente recair num elogio exacerbado, sem uma postura crítica, que identifique aspectos problemáticos em diferentes realidades asiáticas, como questões de gênero, por exemplo?

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    1. Excelentíssima questão, é por esse motivo que é tão importante o cuidado com as expressões linguísticas ao trabalhar esse assunto que é pouco abordado nas aulas de história, uma vez que, o estudo a história oriental não significa querer demostrar quem foi a vítima ou quem é melhor, mas sim compreender como as coisas realmente de desenvolveram no processo histórico.

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    2. Sim, Sra. Maria Eugênia Silva e Silva, é justamente nisso que eu acredito enquanto um esforço qualificado de historiografia crítica sobre a Ásia... pra mim é um dos primeiros passos metodológicos neste sentido... sim, sim, concordo plenamente com tua resposta...

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    3. Isso, Matheus, sempre há o risco, mas devemos cuidar e observar se a visão exagera no elogio ou na depreciação, esse é o trabalho do professor/pesquisador de História: questionar o texto, a narrativa, a informação. De fato, não é esperado de um professor dessa disciplina uma postura acrítica, ainda mais nos dias de hoje em que essa questão está ficando cada vez mais em evidência. Seria lamentável sair do estereótipo para uma visão superficial e romantizada.

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    4. Sim, sim, acredito, Sra. Alina Silva Sousa de Miranda, que, do ponto de vista do professor de História neste ofício especificamente, uma auto-disciplina que sempre cultive uma atenção constante em aspectos lógico-racionais e linguístico-semânticos deva prevalecer, além, claro, das dimensões neuro-psicológicas, que, com certeza, são irrevogáveis a todo processo de sociabilização do conhecimento... penso que, assim, conseguiríamos nos afastar minimamente tanto de um elogio exacerbado quanto de uma depreciação destrutiva... mais um desafio... ;)

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  7. Nas universidades, de maneira geral, as discussões são bastante tímidas (quando não inexistentes, no formato de disciplinas optativas) no que diz respeito a história do Oriente. Isso não acaba interferindo na escolha do professor de ensino fundamental e médio em não focar nessa temática?
    Gostei muito do texto, obrigada!
    Janaina de Paula do Espírito Santo.

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    1. Olá, Sra. Janaina! Fico muito feliz que tenha lido o nosso texto. Com relação a sua pergunta, acredito que sim, pois como já se sabe ninguém vai pôr em pratica algo que não lhe foi ensinado, mas não podemos resumir a ausência do trabalho dessa temática em sala de aula apenas a isso, uma vez que, a quantidade aulas da disciplina história, o não compromisso de alguns professores com a construção do conhecimento de seus alunos, o grande número de conteúdo a ser trabalhado durante todo o ano letivo, a quantidade de escolas em que a grande maioria dos professores trabalham (o que acaba não acontecendo o planejamento adequado das aulas), essas e outras situações contribuem para a ausência do estudo de um assunto tão importante pelos discentes.

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    2. Sim, Janaína, interfere e muito. Daí a necessidade de formação continuada e de simpósios como esse que ampliam e dão visibilidade ao tema.

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  8. Jayza Monteiro Almeida4 de outubro de 2021 às 18:25

    Boa noite, achei o trabalho interessantíssimo e me trouxe a diversas situações que vivenciei na educação básica com o 6º ano. As visões trazidas do fundamental I, eram imbuídas de etnocentrismo e preconceito por diversas vezes. Gostaria de perguntar, como trabalhar com a história oriental no fundamental quando o planejamento escolar não contempla mais do que uma ou duas aulas para a disciplina. O enfoque para ter o conhecimento significativo deve ser por uma vertente cultural ou política? Obrigada e excelente trabalho.

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  9. Jayza Monteiro Almeida4 de outubro de 2021 às 18:31

    Boa noite, achei o trabalho interessantíssimo e me trouxe a diversas situações que vivenciei na educação básica com o 6º ano. As visões trazidas do fundamental I, eram imbuídas de etnocentrismo e preconceito por diversas vezes. Gostaria de perguntar, como trabalhar com a história oriental no fundamental quando o planejamento escolar não contempla mais do que uma ou duas aulas para a disciplina. O enfoque para ter o conhecimento significativo deve ser por uma vertente cultural ou política? Obrigada e excelente trabalho.


    Jayza Monteiro Almeida

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    1. Olá! Sra. Jayza! Fico muito feliz que tenha gostado do nosso texto. No que se refere a sua pergunta, creio que uma das soluções para essa situação seria passar aos alunos, como trabalho de casa, a realização de pesquisas sobre o que estava acontecendo na Ásia no período em que determinado acontecimento histórico que estar sendo estudado acontecia, para que no dia das aulas de história isso fosse discutido e realizadas as adequações necessárias dos conhecimentos dos alunos, pois não devemos esquecer que o professor não deve ser um mero transmissor de conhecimento, mas sim, o mediador do conhecimento e o aluno. Acredito que forcar no estudo do aspecto cultural ou político da história oriental deixaria muitas lacunas, como mencionado anteriormente em uma das repostas acima, o melhor seria o estudo do aspecto social, pelo fato da sua organização ser influenciadas pelas forças políticas, culturais e econômicas.

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    2. De fato, é uma ausência que pode ser eliminada aos poucos. Creio que uma das soluções possa ser o recurso das atividades assíncronas ou de pesquisa. Também creio que questionar a divisão da História e problematizar a ideia de tempo/espaço/narrativa pode ajudar a gerar curiosidade por saber o que estava ocorrendo nos espaços não privilegiados por essa mesma narrativa/divisão e isso pode ser feito em qualquer tema, não apenas naqueles dedicados aos orientais. Creio que um pouco de reflexão, adequada ao nível dos alunos, sobre a produção do conhecimento histórico pode ajudar muito.

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  10. Primeiramente,
    Parabéns, às autoras Maria Eugênia e Alina Miranda, excelente texto, bem reflexivo e, articulado. Dito isso, de que forma os livros didáticos reproduzem estereótipos unânimes ao se tratar do Oriente na Educação Básica? E qual a maneira mais viável, para se romper com esse tradicionalismo e deturpação existente em sala de aula?
    Pois, ao se tratar da própria formação inicial, infelizmente na academia brasileira, o currículo, principalmente, de Licenciatura em História, geralmente é integrado, por um rol de componentes que privilegiem esse processo de europeização ( ex.: disciplina de Idade Média de 90 horas etc.). E que reflete na formação docente, e consequentemente, discente. Assim, Como vocês percebem isso?
    Desde já, as agradeço!

    Maykon Albuquerque Lacerda

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    1. É o que temos dito acima. É uma construção, espaços articulados ao ensino, como eventos científicos, podem ampliar esse conhecimento enquanto ele não se estabelece como importante e inescapável. Acho que a sensibilidade para a questão só aumenta e é normal, nesse início, olharmos mais para o que falta e desejar soluções institucionais, de cima para baixo. Mas creio que com a autonomia docente é possível incluir a temática. Esse artigo, inclusive, surgiu dessa experiência: a disciplina era "História da Europa", e na parte dedicada a pensar as relações entre Ásia e Europa/Oriente e Ocidente, a pesquisa foi de encontro com a produção historiográfica, o problema da narrativa, do etnocentrismo e dos misticismos criados pela narrativa unilateral.

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    2. Sr. Maykon, creio que os livros didáticos reproduzem os estereótipos a partir do momento em que nos mesmos é apenas citada a presença dos povos asiáticos em alguns dos acontecimentos históricos, o que consequentemente contribui no fortalecimento da visão do “Outro” como algo bem distante de nós. No que se refere ao rompimento do tradicionalismo, entendo que uma das soluções seria o aprofundamento das discussões quando estes forem citados no estudo dos conteúdos referentes aos eventos que sempre são destacados nos livros didáticos de história, pois assim os discentes, no decorrer de sua formação, poderão pouco a pouco compreender a importância e contribuições dos povos denominados “orientais” na história. Como dito na resposta anterior, um grande exemplo disso, são as discussões que deram origem ao nosso texto, onde a disciplina em que estas foram realizadas não eram necessariamente voltadas para o estudo dos povos asiáticos, mas que mesmo assim houve profundas reflexões sobre a sua relação com os europeus.

      Maria Eugênia Silva e Silva

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  11. Vitor Alves Souza Alecrim6 de outubro de 2021 às 14:52

    Primeiramente, meus parabéns, às autoras pelo excelente texto, e de grande importância para reflexões. Dito isso, uma vez que não há a obrigatoriedade da disciplina de História do Oriente (Ou Orientes) em nível superior, não seria uma boa contramedida a criação de disciplinas optativas que versassem sobre tal temática no processo de formação de professores. Visando que estes se qualificassem para o ensino de tal conteúdo, servindo como suporte a falta de conteúdos de tal temática nos livros didáticos? Ou mesmo a possibilidade de promoção de formações continuadas sobre esta temática, como forma de combate ao desconhecimento desta temática?

    Vitor Alves Souza Alecrim

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    1. Sim, e além das optativas, devemos nos esforçar para ampliar o acesso a essa literatura e estimular os trabalhos de tradução delas, tirando-nos desse circuito historiográfico predominantemente ocidental.

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    2. Também concordo plenamente com tudo que dissertes, creio que tudo isso contribuiria fortemente com a presença das discussões dessa temática no meio acadêmico e principalmente na educação básica.

      Maria Eugênia Silva e Silva

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  12. Carla Cristina Barbosa
    Prezadas autoras Maria Eugênia e Alina Silva,gostaria de parabenizar pelo texto e saber como podemos trabalhar na Educação Básica os termos “Oriente” e “Ocidente”; Como podemos trabalhar aulas de História, de maneira a romper com essa visão estereotipada e negacionista dos povos denominados “orientais”?

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    1. Um pouco de reflexão, adequada ao nível dos alunos, sobre a produção do conhecimento histórico pode ajudar muito. Compreender o processo de produção de narrativa, fazendo a História ser menos informação e mais costura de informação ajuda a mudar o ângulo.

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    2. Sem dúvida, uma das possibilidades para o rompimento dessa visão estereotipada e negacionista em relação a esses povos é fazê-los conhecidos pelos discentes, através de discussões mais aprofundadas sobre os mesmos em sala de aula.


      Maria Eugênia Silva e Silva

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